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Balanço Econômico de 2024 da FIESC: otimismo empresarial contrasta com críticas à política fiscal

Foto: Mário Cézar de Aguiar, Presidente da FIESC / Crédito: divulgação.

Na apresentação do Balanço Econômico de 2024, o presidente da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina (FIESC), Mario Cezar de Aguiar, destacou os avanços da indústria catarinense em geração de empregos e produção industrial. Mas grande parte do discurso foi direcionada a críticas à política fiscal e monetária do governo federal, com alertas sobre riscos à sustentabilidade econômica em 2025, porém essa postura diverge do otimismo demonstrado pelos empresários locais e de análises que questionam as narrativas conservadoras sobre o déficit fiscal.

O desempenho da economia catarinense em 2024 reafirmou o protagonismo do estado no cenário nacional:

    • Geração de empregos formais: Foram criados 59,5 mil novos postos de trabalho na indústria entre janeiro e outubro. Os principais destaques foram:
      • Construção civil: +13,7 mil empregos.
      • Têxtil, confecção e calçados: +9,3 mil empregos.
      • Máquinas e equipamentos: +4,3 mil empregos.
    • Produção industrial: O estado registrou um crescimento acumulado de 6,8%, mais do que o dobro da média nacional. Os setores líderes foram:
      • Materiais elétricos: +15,9%.
      • Metalurgia: +11%.
    • Confiança e intenção de investir:
      A intenção de investir na indústria atingiu 65,7 em outubro, superando a média nacional de 58,3. Já o índice de confiança do industrial alcançou 52,7 em novembro, com uma média anual de 51,0, demonstrando estabilidade e otimismo moderado.

 

 

Críticas da FIESC: Crescimento Insustentável?

Apesar dos dados positivos, Mario Cezar de Aguiar reforçou críticas ao cenário fiscal e monetário do Brasil, argumentando que o crescimento de 2024 foi impulsionado por políticas públicas que pressionaram os juros, desvalorizaram o real e elevaram o endividamento público. Segundo ele:

“O estímulo fiscal excessivo aqueceu a economia, pressionou os juros e elevou o endividamento público. A falta de credibilidade fiscal desvalorizou o real, elevou as expectativas de inflação e pode restringir o crescimento para 2025.” Mario Cezar de Aguiar, Presidente da FIESC

Curiosamente, os próprios empresários catarinenses parecem discordar, ao menos em parte, das críticas da FIESC. Como destacado acima, o índice de intenção de investir na indústria em Santa Catarina não apenas se manteve elevado ao longo de 2024, como também superou a média nacional. Isso reflete uma confiança mais sólida no potencial de crescimento e na capacidade de adaptação às condições econômicas. Essa discrepância sugere que, enquanto a FIESC foca nas fragilidades do cenário fiscal, os industriais enxergam oportunidades em meio aos desafios. Setores como construção civil, têxtil e materiais elétricos colhem os frutos do estímulo fiscal, com aumento de demanda e geração de empregos.

Do ponto de vista teórico, a política fiscal expansionista adotada em 2024 encontra e em economistas que defendem o papel do governo no estímulo à demanda agregada, especialmente em momentos de incerteza econômica. A teoria keynesiana enfatiza que gastos governamentais podem gerar efeitos multiplicadores na economia, incentivando o consumo e o investimento privado. No caso do Brasil, o estímulo fiscal foi essencial para:

 

  • Sustentar a demanda interna, especialmente em setores sensíveis, como construção e consumo de bens duráveis.
  • Reduzir a ociosidade da capacidade produtiva, criando um ambiente mais favorável para novos investimentos.

 

Por outro lado, a sustentabilidade dessa política depende de esforços para conter o crescimento do déficit fiscal no médio prazo, o que requer:

 

  • Reformas estruturais, como a tributária, para aumentar a eficiência e a justiça fiscal.
  • Melhoria da credibilidade fiscal, com maior transparência e previsibilidade na gestão das contas públicas.
  • Iniciativas para impulsionar a produtividade, como investimentos em infraestrutura e qualificação da mão de obra.

 

O Papel do Banco Central e as Expectativas Empresariais

 

As críticas de Aguiar também recaem sobre a condução da política monetária. A desvalorização do real, que atingiu cerca de R$ 6,00 em 2024, e os juros elevados (Selic em 13,75%) foram apontados como barreiras ao crescimento sustentável. No entanto, a postura do Banco Central, que reduziu drasticamente suas intervenções no câmbio em 2023 e 2024, reflete uma estratégia de preservação das reservas cambiais, em contraste com a gestão anterior.

Uma análise mais ampla revela que o comportamento do câmbio não pode ser atribuído unicamente à política fiscal. Entre 2019 e 2022, durante a gestão Bolsonaro, o Banco Central atuou 113 vezes no mercado à vista, vendendo US$ 74 bilhões para conter a alta do dólar. Essa intervenção ajudou temporariamente a manter a moeda americana em patamares controlados. Na gestão Lula, o Banco Central realizou apenas uma intervenção, em setembro de 2024, ofertando US$ 1,5 bilhão. Como resultado, o dólar atingiu a marca de R$ 6,00, refletindo a combinação de fatores como maior aversão global ao risco e menor intervenção no câmbio.  Essa política, embora tenha elevado os custos para setores dependentes de insumos importados, também favoreceu a competitividade das exportações, beneficiando estados como Santa Catarina, que têm uma economia altamente integrada ao mercado internacional.

Os argumentos apresentados pela FIESC trazem pontos válidos, como o impacto do estímulo fiscal na economia, mas deixam de considerar o papel de políticas públicas em momentos de recuperação econômica. O consumo das famílias e os gastos do governo ajudaram a sustentar setores estratégicos da economia, incluindo a indústria catarinense.

Para 2025, as perspectivas são de um crescimento mais moderado devido a fatores como:

 

  • Inflação elevada: espera-se que a pressão inflacionária mantenha a taxa Selic em 13,5% no próximo ano.
  • Cenário global adverso: tensões comerciais e políticas monetárias restritivas podem desacelerar a economia global, impactando exportações e investimentos.

 

As críticas da FIESC refletem preocupações legítimas, mas precisam ser contextualizadas. O estímulo fiscal de 2024 foi uma resposta necessária para impulsionar a economia, especialmente após os efeitos prolongados da pandemia e do cenário global incerto. Contudo, o desafio para 2025 será encontrar o equilíbrio entre a responsabilidade fiscal e a manutenção de políticas que fomentem o crescimento. No âmbito estadual, a necessidade de qualificação da mão de obra e a redução do Custo Brasil permanecem como os maiores desafios para a competitividade da indústria catarinense. Além disso, uma política monetária mais coordenada e intervenções cambiais estratégicas podem trazer maior estabilidade ao cenário macroeconômico.

A crítica da FIESC reflete preocupações do setor industrial, especialmente sobre:

 

  • O endividamento público, que aumenta os custos financeiros e reduz o espaço fiscal para investimentos.
  • A desvalorização cambial, que impacta diretamente os custos de insumos e matérias-primas importadas.
  • A pressão inflacionária, que exige taxas de juros mais altas e desincentiva novos investimentos.

 

Embora esses pontos sejam relevantes, a análise da FIESC omitiu o papel fundamental das políticas fiscais e de consumo das famílias no aquecimento econômico e no desempenho expressivo de setores como a indústria catarinense, que cresceu mais do que o dobro da média nacional.  Segundo Aguiar, “a falta de credibilidade fiscal desvalorizou o real, elevou as expectativas de inflação e pode restringir o crescimento para 2025.”

O contraponto às críticas da FIESC ao déficit fiscal contrasta com análises mais progressistas, como a do deputado federal Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR), conhecido por sua atuação em temas econômicos e tributários, vasta experiência acadêmica em economia e ex-secretário da fazenda no Paraná, é também um crítico conhecido aos governos do PT. Em um discurso na tribuna da Câmara, Hauly desafiou a narrativa de que o Brasil estaria “quebrado”. Ele argumentou que, em uma comparação internacional, o país apresenta fundamentos econômicos robustos:

 

  • Reservas Cambiais: o Brasil possui mais reservas internacionais do que a média dos países da OCDE, garantindo maior estabilidade em crises externas.
  • Déficit Público: embora o déficit seja uma preocupação, Hauly destacou que está abaixo da média dos países da OCDE. Para ele, dizer que o Brasil enfrenta um colapso fiscal é “irresponsabilidade” e “politicagem de mau gosto”.
  • Superávit Comercial: o Brasil é superavitário na balança comercial, um indicador de força econômica que deveria reforçar a confiança no país.

 

Hauly também criticou o papel do Banco Central, acusando-o de agir em conluio com o mercado financeiro para manter juros elevados e desvalorizar o real. Ele questionou a justificativa econômica para as altas taxas de juros e a disparada do dólar em um cenário de superávit comercial, chamando essas práticas de “crime contra a economia popular”.

 

O Brasil tem um déficit público menor do que a média da OCDE. É grande, é grande. Temos que combater o governo para que ele diminua o custo do governo? Sim. Mas dizer que o Brasil está quebrado, isso é irresponsabilidade, é politicagem de mau gosto contra o nosso povo. Isso é crime de lesa-pátria. O que o mercado financeiro vem fazendo com a economia chama-se crime contra a ordem econômica e a economia popular, meu caro presidente. Somos superavitários na balança comercial? Que papo furado é esse? Não sou governo, não defendo o governo, mas sou brasileiro patriota e defendo a economia brasileira.Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR)

 

Os dados de confiança e intenção de investir mostram que os empresários catarinenses demonstram mais otimismo do que as análises críticas da FIESC sugerem. Setores como construção civil, têxtil e materiais elétricos colheram os frutos do estímulo fiscal, com aumento de demanda e geração de empregos.

Para 2025, as perspectivas são desafiadoras:

 

  • Inflação elevada: a pressão inflacionária deve manter a Selic em 13,5%.
  • Cenário global adverso: tensões comerciais e políticas monetárias restritivas podem impactar exportações.
  • Falta de mão de obra qualificada: citada por 37,2% das indústrias como o principal entrave ao crescimento.

 

Além disso, o Custo Brasil, amplificado pela alta carga tributária (32,1% dos empresários), permanece como um obstáculo estrutural.

 

Principais Desafios: falta de mão de obra e custo brasil

A falta de mão de obra qualificada foi apontada por 37,2% das indústrias como o maior obstáculo ao desenvolvimento. O alto custo da força de trabalho, associado ao mercado aquecido e aos salários elevados no estado, agrava o problema.

Outro ponto crítico é a elevada carga tributária, destacada por 32,1% dos empresários como um fator que prejudica a competitividade e eleva os custos de produção.

 

O cenário para 2025 traz preocupações relacionadas ao ambiente global e às políticas monetárias:

  • Cenário global: espera-se uma desaceleração econômica global, impulsionada por políticas monetárias restritivas e tensões comerciais.
  • Política monetária nacional: com a inflação acima da meta, a taxa Selic pode encerrar 2025 em 13,5%, elevando o custo do crédito e desincentivando investimentos.
  • Impacto nos investimentos: a combinação de juros altos e restrição ao crédito pode desacelerar os novos projetos industriais.

 

Durante a apresentação, Mario Cezar de Aguiar destacou que o Bolsa Família poderia ser um dos fatores desestimulantes à formalização da mão de obra, alegando que muitos beneficiários preferem permanecer no mercado informal ou não aceitar empregos formais para não perder o benefício.

No entanto, a análise da FIESC sobre o Bolsa Família precisa considerar nuances importantes do perfil socioeconômico:

 

Perfil dos Beneficiários de acordo com dados do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome:

  • 58,1 % dos beneficiários são do sexo feminino.
  • 83,6% das responsáveis familiares são mulheres, responsáveis por atividades domésticas e pelos cuidados com filhos e dependentes.
  • 30% das pessoas contempladas pelo Programa são crianças. Dos 54,4 milhões de indivíduos beneficiados, 16,6 milhões têm entre zero e 11 anos. Outros 7,69 milhões são adolescentes entre 12 e 17 anos.
  • As pessoas de cor preta ou parda representam 78,79% do público atendido, somando 39,63 milhões de pessoas.
  • O benefício atende 233,19 mil famílias com pessoas em situação de rua.
  • 976,13 mil famílias que pertencem a grupos prioritários, por conta da situação de maior vulnerabilidade. Nesse grupo estão: 233,65 mil famílias indígenas; 270,97 mil famílias com pessoas quilombolas; 398,94 mil famílias com pessoas catadoras de material reciclável; 13,64 mil famílias com crianças em situação de trabalho infantil e; 64,23 mil famílias com pessoas resgatadas de trabalho análogo ao escravo.

 

Para muitas mulheres beneficiárias, por exemplo, os custos associados ao trabalho formal – como transporte, alimentação e cuidados com os filhos – tornam inviável a transição para um emprego, especialmente quando a renda oferecida é similar ao benefício do programa. A falta de e, como creches e políticas de inclusão, é um entrave significativo. O discurso da FIESC ignora as barreiras estruturais enfrentadas por beneficiários do Bolsa Família, especialmente mulheres. O problema não está no programa em si, mas na ausência de políticas públicas e incentivos privados que possibilitem a conciliação entre trabalho e cuidados domésticos.

 

Um debate necessário:

O Balanço Econômico de 2024 da FIESC revela uma economia catarinense resiliente, com números expressivos em empregos, produção e intenção de investimento. Contudo, as críticas da entidade à política fiscal e monetária contrastam com as análises de economistas progressistas e com o otimismo demonstrado pelos empresários locais. Para construir um crescimento sustentável em 2025, será necessário um equilíbrio entre responsabilidade fiscal e estímulos adequados ao setor produtivo. Reformas estruturais, políticas inclusivas e um diálogo mais equilibrado entre governo, setor privado e mercado financeiro serão fundamentais para transformar desafios em oportunidades e garantir a competitividade da indústria catarinense em um cenário global incerto, mas também dar um basta ao viés político que dividiu o Brasil e que se reflete no excessivo pessimismo do mercado.

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